Publicado na edição Novembro/Dezembro 2016 da Revista Nosso Clínico
Na edição N.o 104 (Mar/Abr 2015) de Nosso Clínico, foram mostrados relatos de guardiães que enfrentaram verdadeira via crúcis judicial para assegurar o direito de tratar seus cães diagnosticados com a Leishmaniose Visceral Canina (LVC). Isso porque, durante décadas, a legislação brasileira impediu o tratamento de animais que apresentassem resultado positivo para a sorologia da doença.
Claro que esses tutores de boa vontade precisavam de um apoio imprescindível: o de médicos veterinários dedicados e dispostos a recuperar a saúde de seus animais, em vez de submetê-los à eutanásia.
Uma dessas profissionais foi a veterinária com especialização em imunologia Ana Karinne Paiva. Em julho de 2016, ela se viu às voltas com um processo no âmbito do CRMV de seu estado, o Ceará, justamente por se recusar a eutanasiar um cão portador de LVC.
Agora, veterinárias como Ana Karinne e tutores dispostos a salvar as vidas de seus amigos de quatro patas finalmente podem agir de acordo com suas convicções e consciências: o Milteforan™, medicamento utilizado no tratamento da LVC, finalmente foi liberado pelos Ministérios da Saúde e da Agricultura e Abastecimento.
Ana Karinne afirma que é “um alívio” saber que o motivo pelo qual sofreu o processo agora pertence ao passado: “É uma satisfação muito grande saber que poderemos tratar dos animais sem violar qualquer código de ética”, comemora. “Foi para isso que fiz o meu juramento: salvar vidas”, acrescenta, convicta.
Muitas dúvidas, respostas necessárias
A chegada do Milteforan™ ao mercado significa que a LVC deixou de ser um problema?
“Certamente não”, esclarece Marco Ciampi, presidente da ARCA Brasil, ONG que há mais de uma década coloca a prevenção à LVC na sua pauta de assuntos prioritários. “Assim como o advento do coquetel anti-AIDS não tornou menos importante as medidas de prevenção, o Milteforan™ também não dispensa a total vigilância contra a propagação da LVC. Aliás, o lema da campanha da ARCA segue sendo ‘Prevenção é a melhor solução’. Mas todos aqueles que acreditam que os animais possuem o direito à vida reconhecem que o combate à LVC está em um momento histórico no Brasil”, complementa.
O médico veterinário Valdir Avino, que responde pelo departamento regulatório da Virbac no Brasil, relata que o laboratório – responsável por trazer o Milteforan™ para o nosso país – prepara uma diversidade de materiais, em diferentes tipos de mídias, para elucidar dúvidas tanto dos profissionais de saúde quanto dos tutores de animais.
“Vamos disponibilizar informações técnicas abundantes sobre a busca por um diagnóstico correto, o tratamento e o acompanhamento dos cães portadores da enfermidade”, ele explica. “Estamos prevendo a realização de palestras em 14 capitais brasileiras, em que abordaremos temas relevantes sobre a enfermidade e seu tratamento, agora permitido com Milteforan™”.
De acordo com Avino, existe uma ansiedade natural com relação ao medicamento, que estará disponível a partir de janeiro de 2017. “Em linhas gerais, o Milteforan™ é um medicamento de uso controlado, sujeito à retenção de receita emitida por profissional médico veterinário. As autoridades exigem uma completa rastreabilidade de sua comercialização, desde o momento em que ele entra no Brasil, importado de nossa matriz na França, passando pela cadeia interna de distribuição e sua chegada ao tutor”, esclarece.
Novidades tecnológicas
Além do controle oficial, a Virbac vai oferecer aplicativos para smartphones, que ajudarão os médicos veterinários e os tutores a gerenciar os animais em tratamento, com lembretes periódicos para a administração do fármaco e retornos para acompanhamento.
“A aprovação do Milteforan™ representa uma mudança em um paradigma estabelecido em 1963, que determinava a eutanásia de cães portadores da enfermidade”, afirma Avino. “Mas o controle da doença só se tornará uma realidade quando todos os envolvidos assumirem suas responsabilidades. Ou seja, ao profissional veterinário cabem os papéis de prescrever métodos de prevenção, diagnóstico e, agora, tratamento da doença com Milteforan™; já ao proprietário responsável restará cumprir uma agenda de acompanhamento e tratamento regulares”, pondera o especialista.
Virbac CLUB PET app: cães em tratamento precisam ser monitorados. Para auxiliar nesse controle, a Virbac disponibiliza um aplicativo (Android/IOS) onde os animais são cadastrados e, periodicamente, os proprietários recebem lembretes para retorno à clinica e manutenção do tratamento. Saiba mais: http://virbacclubpet.com.br/ ou 0800 770 5050
Legislação: novo medicamento impõe novos paradigmas
A Portaria Interministerial 1.426/2008 proibia explicitamente o tratamento da leishmaniose visceral em cães infectados ou doentes com produtos de uso humano ou não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).
A entrada do Milteforan™ no mercado brasileiro praticamente anula o efeito dessa portaria. Resta saber qual será o entendimento das autoridades em relação ao decreto de mais de 50 anos (1963), que preconiza a “eliminação” do animal doente. A ARCA Brasil sugere que prevaleça o parecer emitido em 2013 por Joaquim Barbosa, então Ministro do STF: “(…), o tratamento de cães com leishmaniose visceral apresenta peculiaridades e deve ser acompanhado por médico veterinário, de maneira a mitigar os riscos à saúde dos animais e da coletividade em geral (…)”.
Ou seja, ele reconheceu a prerrogativa do profissional de medicina veterinária sobre submeter ou não a tratamento o animal com leishmaniose.