Decisão histórica do Tribunal Regional Federal da 3ª Região invalida portaria ministerial que proibia tratamento de cães
O Brasil é o único país do mundo que insiste na eutanásia dos cães como tática de combate à leishmaniose, doença transmitida por um mosquito – e não pelos cães, que na verdade são vítimas. Inaceitável do ponto de vista ético e tecnicamente ineficaz, a estratégia é cruel e só se mantém porque a sociedade ainda não se voltou com a energia necessária para sua erradicação.
Aos poucos, porém, essa realidade está mudando. Graças à coragem de alguns guardiões de cães soropositivos, que foram à luta pelo direito de tratar seus companheiros, e àqueles médicos veterinários que honram a profissão escolhida e merecem ser vistos como exemplos pelos seus colegas, temos hoje casos de sucesso no tratamento da leishmaniose. A tendência é que cada vez menos cidadãos aceitem passivamente a “pena de morte preventiva” para seus leais companheiros, e lutem pela prerrogativa de salvar suas vidas.
Um passo importante nessa direção foi dado no dia 16 de janeiro de 2013, quando uma Decisão do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) invalidou a portaria interministerial que vedava expressamente o tratamento de cães vitimados pela leishmaniose. Movida pela ONG Abrigo dos Bichos, a decisão é válida para todo o País.
No entendimento dos juízes, ao proibir o uso de medicamento humano para tratar os animais, a portaria era praticamente um incentivo ao extermínio sumário. Advogados ouvidos pela ARCA Brasil avaliam que a proibição do tratamento fere a lei por dois motivos: desrespeita uma prerrogativa fundamental da profissão de médico veterinário (cujas diretrizes são previstas em lei), pois coíbe o direito deste profissional decidir qual é o melhor tratamento / encaminhamento para os seus pacientes; e, em segundo lugar, impõe sofrimento e morte aos cães, o que confronta o artigo 32 da Lei de Crimes Ambientais (9605/98):
Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.
Portanto, a lei diz que o tratamento é possível e que os animais, tutelados pelo Estado, podem e devem ter acesso a ele. O bom senso e a ética também rejeitam de antemão esta absurda “escolha” feita pelas autoridades sanitárias brasileiras pela política de “pegar e matar” – aliás, esse tipo de arbitrariedade não tem espaço em democracias maduras, como as europeias, nas quais a população está habituada a se fazer ouvir e exige energicamente seus direitos.
Diante desse quadro, a ARCA Brasil celebra a decisão do TRF-3 como uma vitória importante, porém pontual. O que se faz urgente é a revisão do Programa de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral, com foco na prevenção e no combate ao mosquito transmissor. Em suma, queremos uma mudança efetiva na mentalidade das autoridades que definem as políticas para o setor e maior respeito com o cão, cada vez mais um integrante da família brasileira, merecedor de carinho e cuidados.
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