Polêmica e esperança se misturam no 3º encontro da ARCA Brasil
O 3º Seminário Veterinário Solidário: Responsabilidade Social & Crescimento Profissional, promovido pelaARCA Brasil, aprofundou questões de interesse público, com relevância para o clínico e sociedade em geral. Confira aqui o que foi destaque no evento.
A abertura do encontro ficou a cargo da Dra. Rosangela Ribeiro, responsável técnica da ARCA. “Achei o evento maravilhoso, apesar do tempo restrito que tivemos desta vez”, comentou ela. O primeiro bloco debateu a polêmica portaria interministerial nº 1.429/2008, que proíbe o tratamento de cães infectados pela Leishmaniose Visceral Canina (LVC), selando o destino desses animais. Fábio Nogueira, professor da Fundação Educacional de Andradina (FEA), iniciou o debate revelando que a incidência da doença aumenta na região sudeste do país, em particular nas camadas sociais mais carentes, sendo 54,4% dos infectados crianças menores de cinco anos. A cidade de Araçatuba, a noroeste do estado de São Paulo, registrou o primeiro caso. “Hoje em dia, há 20 municípios com casos de LVC cuja transmissão se deu pelo cão, 47 municípios com transmissão canina e humana, 22 com situações de receptividade e vulnerabilidade e 335 não receptivos, mas vulneráveis”, divulgou.
O professor Nogueira detalhou todo o ciclo da Leishmaniose, exibindo vídeos de ambientes onde o inseto transmissor – conhecido como mosquito-palha – costuma proliferar, em especial na presença de animais ou de seus recintos, como chiqueiros e galinheiros. “O mosquito-palha é pequeno, pousa com as asas ligeiramente inclinadas para cima e tem hábito crepuscular. Portanto, é importante não deixar o cachorro próximo a esses ambientes, em especial no final da tarde, quando as chances de transmissão são maiores”, destacou o professor.
A temperatura aumentou com a fala do Dr. Vitor Ribeiro (à esquerda), professor da PUC-MG, que focou a portaria que proibiu o tratamento dos cães infectados. “É um equívoco condenar o animal, pois ninguém dá a vida gerando a morte”, protestou o professor referindo-se ao método ainda aplicado pelos agentes de saúde. “A experiência tem demonstrado a ineficiência dessa prática, pois os casos da doença só têm aumentado. Quando os cães são tratados, o índice de transmissão diminui. Na Europa, o tratamento é usado há cerca de 50 anos. No Brasil, ele pode ser usado como controle da infecção desde 1988”, afirmou. Outro aspecto lembrado foram os métodos de prevenção da Leishmaniose, como a vacina, as coleiras repelentes, o controle populacional de cães e gatos e a educação da população.
O Dr. Ribeiro enfatizou a importância do proprietário e do veterinário na terapêutica do cachorro infectado. “Esse não é um tratamento qualquer, pois exige acompanhamento para o resto da vida. O dono deve ser mais que dedicado, ele precisa amar demais o animal, usar todos os meios disponíveis, como medicamento, colar repelente ou pomada de uso tópico e inseticida”. Ele defendeu uma ampla mudança das políticas públicas para a questão. “Por que não combater o mosquito vetor? Em vez de o agente visitar a residência para verificar se o cachorro tem a Leishmaniose, ele pode fazer uma vistoria, eliminar os possíveis criadouros do mosquito e educar os moradores, como é feito no caso da dengue. Ou ainda por que não promover uma vacinação em massa dos cães? Nesse caso, a verba governamental tem que aparecer”, defendeu o pesquisador, pontuando questões que, até o momento, permanecem sem respostas.
Após o coffee-break, foi a vez da apresentação do professor Marco Gioso, (à esquerda) presidente da Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais (Anclivepa-SP), que abordou as novas legislações e seus impactos para o profissional de medicina veterinária. “Não devemos culpar os outros, pois quando algo dá errado, a responsabilidade é nossa mesmo”, refletiu Gioso, sobre a necessidade de se lutar pelos próprios direitos e por aquilo em que se acredita. Ele citou como fundamental o aspecto da aplicabilidade de uma lei, sem a prévia discussão junto à população. Ele usou como exemplo a Lei Municipal nº 14.483/07, que obriga criadores de cães e gatos a castrar e microchipar os animais comercializados no município de São Paulo. Ou ainda a Lei Estadual nº 12.916, que proíbe os sacrifícios de animais saudáveis pelos setores de Controle de Zoonoses, o que tem motivado críticas de contribuir com a superlotação nos canis públicos e o aumento de animais abandonados nas ruas. “Sempre é bom refletir, contanto que todos falem e sejam ouvidos, entendendo que outras cabeças podem pensar diferente”, resumiu sobre a importância das discussões sobre bem-estar animal na sociedade.
Veterinários pelo Social
O final do evento foi reservado para a apresentação de experiências de sucesso na gestão de clínicas que realizam castrações de cães e gatos em alto volume e a preços reduzidos. É o caso dos Veterinários Solidários Erik Rodrigues (na foto, à esquerda), Jorge Kachan (à direita) e Fernanda Conde Ferreira. “Comecei no projeto de Taboão da Serra, criado pela ARCA Brasil, onde atuei de 1996 a 1998. Depois, montei clínica no Brooklin e há dois anos desenvolvo castrações a preços especiais”, conta o Dr. Jorge, que realiza esse serviço uma vez por semana. Já o Dr. Erik realiza cerca de 1000 castrações por mês. “Achei super importante mostrar minha experiência, para que os outros não passem pelas mesmas dificuldades que eu tive”, comentou. Segundo ele, o mais difícil é fazer com que as pessoas confiem no trabalho de profissional que cobra pouco. “Você tem que provar que o serviço é prestado com qualidade”, conclui. A médica veterinária Fernanda Ferreira, grávida de oito meses, falou sobre o trabalho desenvolvido na zona norte da capital paulista. “Sou defensora dos animais e, com o tempo, percebi que podia ajudá-los e também crescer profissionalmente”. Ela dá a dica para quem começa. “É só com a prática que se aprende a castrar mais rápido”. O estilo de atuação diversificado dos profissionais chamou a atenção de Rosangela Ribeiro, veterinária técnica responsável da ARCA Brasil. “Cada profissional tinha um perfil diferente, mas a intenção de ajudar os animais era a mesma”.
Para o Presidente da ARCA Brasil, Marco Ciampi (na foto, ao centro, com o microfone), “realizar um evento desse porte é sempre um desafio, somos obrigados a equacionar inúmeras tarefas e compromissos”, disse, confirmando o objetivo de que, cada vez mais, as ações da entidade visam a algum efeito duradouro. “Nesse sentido, temos a satisfação de afirmar que esses encontros realmente fizeram a diferença pelos animais no país”.
Os projetos, eventos e outras ações da ARCA BRASIL - Associação Humanitária de Proteção e Bem-Estar Animal, entidade não governamental sem fins lucrativos, independente e apartidária, inauguraram uma nova era de esperança e respeito aos direitos dos animais no país.